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R$ 100 mi em vendas: taxações de Trump podem afetar o Oeste, maior polo de proteína do Brasil

Setor mais atingido na região diz respeito às exportações de tilápias que, somente neste ano, somam mais da metade do valor exportado, quase R$ 60
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Por: Tissiane Merlak

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R$ 100 mi em vendas: taxações de Trump podem afetar o Oeste, maior polo de proteína do Brasil

Setor mais atingido na região diz respeito às exportações de tilápias que, somente neste ano, somam mais da metade do valor exportado, quase R$ 60 milhões
Paraná é o maior produtor de tilápias do Brasil com quase dois terços da produção CRÉDITO: Jonathan Campos / AEN

Uma bomba fiscal paira sobre o agronegócio do oeste do Paraná. A decisão do governo norte-americano de Donald Trump de aplicar uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, entre eles carnes e proteína em geral vão comprometer seriamente o desempenho de exportações para os EUA da principal região produtora de proteína animal do Brasil: o oeste do Paraná. Dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic) indicam que, somente no primeiro semestre de 2025, as sete maiores economias do oeste paranaense – Cascavel, Toledo, Foz do Iguaçu, Medianeira, Cafelândia, Palotina e Marechal Cândido Rondon, movimentaram quase R$ 100 milhões em exportações para os Estados Unidos. E grande parte desse montante — mais de 87% em volume físico — foi gerado justamente por proteínas sobretudo de peixes como tilápias, outras carnes, crustáceos e produtos afins.

“Não temos dúvidas que será um segmento altamente afetado e por ser base das exportações regionais, um dos mercados importantes à região será impactado: as exportações de tilápia já que uma fatia gigante da produção regional, que é maior do país, vai para os EUA”, descreve o economista Rui São Pedro.

Os números são contundentes. Apenas os produtos classificados na categoria que abrange peixes, crustáceos e moluscos movimentaram, juntos, cerca de US$ 14,7 milhões e quase 3,4 milhões de quilos líquidos em exportações. Quando se somam os volumes de carnes e derivados, o peso desses produtos fica ainda mais evidente, reforçando o risco da nova taxação representa para a estrutura econômica da região. “E o impacto não se restringe às empresas exportadoras: ele reverbera em toda a cadeia regional, do pequeno produtor ao transporte, passando por cooperativas, processadoras, frigoríficos e empregos diretos e indiretos. Em um primeiro momento esses produtos devem ser lançados ao mercado interno, porém, as exportações sustentam a estrutura das cooperativas e indústrias. Se forem mantidas, haverá desemprego”, completa.

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Oeste é protagonista nacional e vítima em potencial

Especialistas em comércio exterior alertam que, ao mirar setores estratégicos com tarifas pesadas, Trump não apenas responde a disputas comerciais com o Brasil, mas também envia uma mensagem de proteção ao mercado interno americano. “É uma medida que visa agradar a indústria local de carne dos EUA, que se sente pressionada pela competitividade brasileira, especialmente pela qualidade, escala e preço”, afirma Eduardo Martins, analista de mercados internacionais da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Para a especialista em direito econômico Regina Martins, o custo real dessas medidas recai sobre o elo mais frágil da cadeia: o produtor, mas com efeitos em todas as frentes. “O consumidor americano vai pagar mais, o governo pode alegar defesa comercial, mas é o agricultor brasileiro, principalmente o da base produtiva regional, que paga a conta com redução de demanda e preço defasado”, avalia.

Representantes do setor de carnes também expressaram preocupação com os efeitos colaterais. Segundo nota da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), “a taxação proposta pelos EUA compromete o fluxo comercial com um dos maiores compradores globais de proteína brasileira, afeta investimentos em expansão e inovação e coloca em risco a manutenção de milhares de postos de trabalho diretos e indiretos”.

A ABPA ainda reforça que a produção do oeste do Paraná não só abastece o mercado externo, mas é essencial para o equilíbrio interno de preços e oferta no Brasil.

Impacto pode ir além das exportações

A possível retração no volume exportado pode afetar a rentabilidade do setor e gerar desequilíbrios logísticos, uma vez que grande parte da estrutura de escoamento foi projetada com base na demanda internacional. Isso inclui portos, centros logísticos e armazéns refrigerados, que hoje funcionam em sinergia com os ciclos de exportação.

“Uma mudança abrupta no destino dessas cargas impacta diretamente o fluxo logístico. Isso pode resultar em ociosidade de infraestrutura, demissões e encarecimento de fretes”, explica Rui São Pedro.

Para Rui, há novos mercados a serem explorados, mas ninguém identifica e fecha negócios com outros mercados do dia para a noite. “O Brasil teve menos de um mês para se preparar. Isso significa que não há colo encontrar outros compradores externos em tão pouco tempo, o que o governo brasileiro quer são mais 90 dias para as negociações”, destaca.

Risco de efeito dominó na economia regional

Com a desaceleração das exportações, há também o risco de um efeito cascata: empresas processadoras podem reduzir turnos ou suspender contratações, cooperativas podem postergar investimentos, e municípios do oeste paranaense — altamente dependentes da agroindústria — podem ver sua arrecadação despencar, sobretudo os que apostaram amplamente em plantas para produção de peixes voltado para os EUA.

“É um cenário que exige reação rápida e estratégica. O governo brasileiro precisa articular ações diplomáticas e reforçar acordos multilaterais, ao mesmo tempo em que ampara os setores mais afetados internamente”, afirma Regina Martins.

Diante do impasse com os EUA, exportadores já começam a olhar para alternativas como China, Oriente Médio e países do Sudeste Asiático. No entanto, especialistas alertam que reposicionar mercados não é uma operação simples nem imediata. “Há questões sanitárias, logísticas e diplomáticas envolvidas. Além disso, o volume absorvido por esses novos mercados dificilmente substitui a fatia representada pelos EUA a curto prazo”, explica Martins.

Embora ainda haja margem para negociação antes da efetivação das novas tarifas, o alerta está aceso. “O oeste do Paraná, que até aqui vinha sendo vitrine da competitividade brasileira em proteína animal, sobretudo nos peixes como a tilápia, pode se tornar símbolo dos efeitos colaterais de guerras comerciais internacionais — em um cenário em que quem produz muito, ironicamente, pode vender menos”, descreve.

 

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