Aconteceu há 70 anos

Muito do que se decidiu em 1954 deixou consequências positivas, mas também houve tragédias

Aconteceu há 70 anos

Muito do que se decidiu em 1954 deixou consequências positivas, mas também houve tragédias
Em 1954, Getúlio Vargas saiu da vida para entrar na história. O getulista Manoel Ludgero Pompeu fez muita história nesse ano
Em 1954, Getúlio Vargas saiu da vida para entrar na história. O getulista Manoel Ludgero Pompeu fez muita história nesse ano

Fazer um balanço do ano de 2024 para a região Oeste, o Estado e o país é um exercício de memória que só se completa com avaliações sobre como, no curso da história, a região chegou ao brilhante estágio atual. Mantendo evocações históricas em 70 anos no passado, remontar a 1954 lembra ameaças de golpe de Estado e tragédias, como atualmente, mas em contrapartida apresentou consolidação do Paraná como Estado. 

Para o Brasil, 1954 foi um ano terrível. Tramada dentro do próprio palácio do governo, a tentativa de assassinato do jornalista Carlos Lacerda tinha a intenção de enfraquecer a oposição ao governo federal, mas apresentou um imprevisto: a morte do major Rubens Vaz, da Força Aérea Brasileira (FAB). 

O mandante do crime, que visava tirar de cena um dos principais opositores civis ao governo mas só conseguiu irritar os militares, foi Gregório Fortunato, chefe da guarda pessoal do presidente Getúlio Vargas. Os militares exigiram a renúncia de Vargas, que se negou a deixar o poder, matando-se com um tiro em 24 de agosto. 

Em Cascavel, a tragédia foi a morte do vereador Adelino Cattani em duelo com João Miotto (https://x.gd/PTjq1). 

De modo geral, o ano foi de estiagem e dificuldades econômicas. Para a região Oeste, especialmente para Cascavel, entretanto, a economia exibia um progresso invejável, só obscurecido pela a morte de Vargas, o líder que desde a década de 1930 sempre resolvia seus problemas.  

A ousadia de Pompeu

A região vivia o pleno desenvolvimento decorrente do comércio de madeira para a reconstrução da Europa no pós-II Guerra. A riqueza das exportações resultou em um anel de propriedades rurais ao redor de cidades como Cascavel e Toledo, que por ter a mesma terra-roxa do Norte pensava-se que poderiam apresentar safras de café igualmente portentosas.

O rápido progresso e o interesse despertado por muitas famílias no Sul, devido à minifundiarização que avançava no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, levou um importante líder regional ligado ao getulismo, Manoel Ludgero Pompeu, a ousar uma aventura que raros teriam condições (e coragem) para promover.

Utilizando exclusivamente recursos próprios, Pompeu partiu do prolongamento da atual Avenida Carlos Gomes em direção ao Sul, abrindo picadas no sertão, encontrando a antiga linha telegráfica (levantada no início do século pela turma de Cândido Rondon) e chegou às margens do Rio Iguaçu, no ponto em que hoje se localiza a sede de Capitão Leônidas Marques.

Era a primeira tentativa de ligar Cascavel diretamente ao Sul do país, colada no conjunto de atividades estruturais visando à expansão das frentes colonizadoras. 

Terror na luta pela terra

Nesse mesmo sentido surgiu em janeiro de 1954, de imediato regulamentado em maio, o Instituto Nacional de Imigração e Colonização (Inic), no âmbito do Ministério da Agricultura, para organizar a migração interna e a alocação de imigrantes. 

Tinha a finalidade de “traçar e executar, direta e indiretamente, o programa nacional de colonização, tendo em vista a fixação de imigrantes e o maior acesso aos nacionais da pequena propriedade agrícola”. Claramente seu objetivo era disciplinar a ação das companhias colonizadoras, que contratavam homens armados para expulsar os posseiros.

Havia titulações superpostas de terras, confusão cartorial resultante dos conflitos dominiais existentes entre o Paraná e a União, às quais vinha se somar a iniciativa das colonizadoras particulares, com seus jagunços.

“Em duas oportunidades eu fui obrigado a fugir”, lembrava Octacílio Mion, cartorário ligado à família Formighieri que foi prefeito de Cascavel em dois mandatos. “A jagunçada estava armada até os dentes e havia muito crime aqui”, disse ele ao jornal Hoje-Cascavel. “Na época, a vida da gente não valia muito”.

Atraindo moradores

Os migrantes internos não vinham para viver em cidades, mas para ocupar boas terras por meio de posse ou comprá-las de quem veio antes. A família de Carlos Neppel chegou de Canoinhas (SC) ao interior de Cascavel em 1939, em carroça, mas só em 1954 passou a residir na cidade.  

Sapateiro, Neppel foi também o primeiro juiz de paz de Cascavel, função na qual oficializa casamentos, entre os quais os enlaces de Agenor Miotto com Laura Zandoná e de sua irmã Élia Zandoná com Rubens Lopes.

O interesse dos colonos em instalar as famílias na cidade se deu pela facilidade em adquirir os terrenos do Patrimônio Novo e pela necessidade dos filhos, crescendo, de frequentar as escolas, que se estruturavam para receber as crianças e jovens recém-chegados.

Nesse sentido, foi especialmente importante a atuação do vereador Adelar Bertolucci (1928–2012) ao propor na Câmara Municipal várias medidas para facilitar a aquisição de imóveis urbanos. Começou com a lei 45/54, dispondo sobre a divisão por zonas do quadro urbano da cidade de Cascavel e estabelecendo regras para os preços dos lotes.

Era muito para uma só lei, o que levou à lei 46, dividindo a cidade em quatro zonas. Em seguida, à lei 48, estabelecendo condições para a venda dos lotes.

Biblioteca e imprensa 

Desde quando o Município de Cascavel se instalou, em dezembro de 1952, as autoridades municipais, a começar pelo prefeito José Neves Formighieri e seu sucessor, Helberto Schwarz, passaram a distribuir escolas pelo interior e a sonhar com educandários de nível médio, para que os jovens não ficassem sem perspectivas de aprendizado.

A criação de vagas escolares no centro urbano de Cascavel viria se constituir, assim, em um poderoso atrativo para as famílias dos colonos. É exemplar, nesse caso, o Colégio Nossa Senhora Auxiliadora, que sequer contava com um terreno para a construção do prédio, mas foi dado como certo aos católicos pelo padre Guilherme Maria Heyer (1906–1997).

Enquanto as famílias planejavam adquirir os terrenos facilitados, a escola ia se viabilizando porque o grupo escolar não tinha vagas pata todos e os raros professores com formação em escolas normais tinham a dupla tarefa de ensinar os alunos e os colegas ainda em formação.

Sentindo as dificuldades dos alunos e dos próprios professores pela falta de uma biblioteca pública no jovem Município, a diretora do grupo escolar, Aracy Lopes, promoveu um festival estudantil para motivar a criação da biblioteca da escola, concretizada em seguida.

Só dez anos depois, em 1964, seria criada a Biblioteca Municipal. Aracy, filha do professor Aníbal Lopes da Silva, casou-se com Amadeu Rodrigues Pompeu, filho de Manoel Ludgero Pompeu, com quem teve quatro filhos. Eles depois iriam se destacar em Barreiras, como parte da comunidade sulista que desenvolveu o Oeste da Bahia.

Incentivo à industrialização 

Na política, em março de 1954 o secretário municipal Celso Formighieri Sperança entrou em atrito com os vereadores da bancada majoritária na Câmara, o Partido Republicano, e foi exonerado pelo prefeito José Neves Formighieri.

Depois os mesmos vereadores iriam apoiar Sperança na criação do primeiro jornal da cidade, o Correio d’Oeste, dando assim início à indústria gráfica da região. Sua tipografia foi instalada na então Rua das Palmeiras (atual Rua Souza Naves), perto da esquina com a Rua Paraná.

É assim que surge a primeira lei de incentivo à industrialização em Cascavel, proposta pelo vereador Helberto Edwino Schwarz, mais tarde prefeito. Concedia a isenção de tributos até 1958 para as indústrias que se instalassem em Cascavel em 1954.

A lei era ambiciosa e procurava atrair todos os segmentos industriais: 

“1 – Indústria Alimentícia – Fábricas de produtos e conservas alimentícias; II – Indústria de Eletricidade – Produção e distribuição de eletricidade, instalações hidroelétricas, termoelétrico e atividades correlatas; III – Indústria Extrativa Vegetal – Fabrico de papel, papelão e artefatos de papel;

IV – Indústria Têxtil – Fabrico de tecidos, de vestuário e artigos congêneres; V – Indústrias urbanas – Exploração do serviço de água e esgotos e telefones urbanos; VI – Indústrias Gráficas, Tipografias com circulação de órgãos de divulgação; VII – Indústria Cerâmica – Indústria de louças de barro em geral”.

A primeira beneficiada, portanto, foi a indústria gráfica pioneira do ex-secretário Celso Sperança. 

Uma resenha de 1954 seria incompleta sem destacar um episódio marcante ocorrido no dia 9 de junho: o governador Bento Munhoz da Rocha Neto, lembrando as ágoras gregas, convocou a população de Cascavel para resolver, em praça pública, qual deveria ser o nome definitivo da cidade: “Cascavel”, “Aparecida dos Portos” ou “Aparecida do Oeste”. Venceu a primeira por aclamação.

100 anos da revolução: O tormento da espera 

Em dezembro de 1924, no Paraná, os revolucionários aguardam ansiosamente a vinda dos soldados gaúchos, ignorando que estão seriamente embaraçados no Sul. Por sua vez, os governistas aguardam os resultados do cerco empreendido por seus chefes. 

Legalistas e rebeldes sabem estar muito próximos, mas houve muitas baixas nos últimos confrontos e é hora de aguardar.

“Durante esses longos dias de inatividade enervante, passamos matando o tempo nos serviços obrigatórios de patrulha, reconhecimentos, guardas e sentinelas diárias. A vigilância á tanto mais necessária porque cada estreita passagem das florestas pode trazer-nos uma bala do inimigo, oculto em emboscada” (Floriano Napoleão do Brasil Miranda, Revolta!).

A Coluna Gaúcha estará em marcha rumo ao Paraná em 17 de dezembro, data em que Cândido Rondon é efetivado como general de divisão. 

Ao contrário, parados, rebeldes e legalistas se espreitam nos arredores de Catanduvas, em ações de manutenção contidas e defensivas.

Capa do livro de Floriano Napoleão do Brasil Miranda

 

Fonte: Alceu Sperança

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