Desde a proclamação da República o interior foi contemplado com programas insuficientes. Com a Revolução de 1930, o interior do Paraná vem se integrar de fato ao Brasil, já que grande parte do território foi por longo tempo controlada por interesses estrangeiros, sobretudo ingleses e argentinos.
O período posterior à Revolução de 1924, até o início da década da 1940, foi a primeira etapa da reocupação dos espaços vazios por projetos de colonização induzidos pelo Estado na região.
As colonizadoras e os colonos não vieram espontaneamente, por um suposto “desbravamento” em áreas tidas como vazias. Na verdade, em vários pontos havia posseiros e grupos indígenas.
As colonizadoras vendem terras anunciando infraestrutura e terra excelente para cafezais, mas os colonos logo sentem a omissão do Estado e da União. Trabalham por anos até perceber que o café era uma cultura de risco nessa área.
Para piorar, havia uma diferença crucial entre a União e o Estado. A primeira estava submetida à ditadura do Estado Novo. Implantado com falso pretexto – o Plano Cohen, em 1937 –, o regime de inspiração fascista centralizou o poder e sufocou as pressões sociais.
Com a revolução de 1930, a economia do interior passou a florescer sob o comando de brasileiros, mas com a ditadura implantada as pressões se dirigiam só ao Estado, que sofria com fortes restrições orçamentárias.
Adeptos da ditadura venderam ao presidente Getúlio Vargas a ideia de tirar do Paraná a atribuição sobre as regiões Oeste e Sudoeste no bojo do megaprojeto Marcha para Oeste e assim, em 1943, o Território Federal do Iguaçu afasta a autoridade paranaense das duas regiões.
Filho da ditadura estadonovista, o TFI ruiu com a redemocratização, em 1946, na qual despontou a liderança de Bento Munhoz da Rocha Neto, filho do ex-governador Caetano Munhoz da Rocha, líder do Paraná durante a Revolução de 1924.
O fim do TFI devolveu ao Paraná a tarefa de criar infraestrutura para a área, paralisada durante três anos pela incapacidade das autoridades federais.
O desabafo de Ladislau Radecki, um dos fundadores da cidade de Virmond, sintetizou o sentimento generalizado na região depois do fim do TFI:
“Dissabor, em toda a extensão da palavra (...) De modo que esta parcela da União continua como cachorro sem dono, ou cachorro vira-lata”.
O interior do Estado, no final da década de 1940, sofreu com os conflitos pela posse de terras, que aumentaram quando os posseiros atacados pelos grileiros passaram a se defender, partindo para a ofensiva.
Ironicamente, o homem do interior – o governador Moysés Lupion – que prometeu dar voz e vez às comunidades esquecidas do sertão, enfrentava a metralhadora verbal do elitista urbano Bento Munhoz.
Conservador, criado no litoral monárquico dos barões e viscondes, é Bento quem vai se apresentar como o grande defensor dos posseiros no vácuo do proibido PCB.
O governador Moysés Lupion tinha propriedades no Oeste e reorganizou os planos para a região, onde já estava em curso o projeto da colonizadora gaúcha Maripá na área da antiga Fazenda Britânia.
A primeira medida concreta de Lupion nesse sentido foi a criação do Departamento Administrativo do Oeste, em outubro de 1947.
A lei 4 determina que o Departamento do Oeste será formado pelos municípios de Foz do Iguaçu (que inclui Guaíra, o distrito de Cascavel e a vila de Toledo), Laranjeiras do Sul, Mangueirinha e Clevelândia.
Substitui, assim, a estrutura de administração na parte paranaense do extinto Território Federal.
Saudada com entusiasmo por empresas, colonos e posseiros ansiosos por uma solução efetiva para os problemas agrários, a providência cumpria a promessa de criar uma política de atendimento às regiões retomadas do TFI.
O governo estadual, que já havia criado em junho de 1947 a Fundação Paranaense de Colonização e Imigração, com a lei 4 compensava a frustração pelo esvaziamento do Território Federal.
Seus termos causaram entusiasmo na região por se tratar de uma virtual “Secretaria do Oeste”, com sede em Laranjeiras do Sul:
“Art. 7° – Constituído o Conselho Técnico, os municípios compreendidos na jurisdição do Departamento serão convidados a expor seus problemas e planos de realizações municipais, acompanhados dos necessários elementos elucidativos, como plantas, levantamentos, dados estatísticos e outros. De posse desses elementos, o Conselho Técnico elaborará um plano geral de desenvolvimento da região e um plano para a respectiva execução em dois anos, ouvindo os órgãos técnicos especializados do Estado e com assistência permanente dos municípios interessados”.
No entanto, o DAO desde o início sofreu com dois problemas. Primeiro, o governo federal era formalmente democrático, mas em sua estrutura e práticas pouco diferia da gestão Vargas, com o que o interior do Paraná continuava sem o apoio infraestrutural necessário. Segundo, homens de confiança do governo usavam a estrutura oficial do Estado para transações suspeitas.
Em dezembro de 1948 a lei estadual 180 modificou a estrutura do DAO, transferindo a sede de Laranjeiras do Sul para Curitiba. Na prática, era o fim. O que foi prometido ao Oeste em troca do extinto Território Federal estava descumprido.
Alheios a isso, centenas de posseiros continuam a ocupar terras devolutas ou oferecidas pelas colonizadoras no Noroeste e no Oeste, esperando o apoio do Departamento do Oeste. Enquanto isso, a imprensa oligárquica de Curitiba multiplicava as denúncias sobre o envolvimento da polícia do Paraná com os grileiros.
“Enganados pelos inspetores de terras, muitos posseiros reclamam seus direitos e uma caravana policial incendiou ranchos, destruiu roças, violentou mulheres e matou muita gente” (Isidro Garcia, o Chimarrão, jornal Folha da Tarde, 2 de julho de 1951).
“Uma força policial efetuou diligência de despejo em Porecatu, matando quatro lavradores que estavam roçando” (Noel Nascimento, A Revolução do Brasil)
Sem interesse em dinamizar o Departamento do Oeste, criado por seu antecessor Lupion, em maio de 1954 Bento Munhoz o extinguiu com a promessa de aprimorá-lo em futuro arranjo.
Na região, a Prefeitura de Foz do Iguaçu, tentando substituir a ausência da União e do Estado no estímulo aos agricultores da fronteira, assumiu em julho de 1954 o papel de importadora “de máquinas e veículos motorizados, para serem cedidos a preço de custo aos agricultores, criadores e colonizadores estabelecidos neste Município”.
Um mês depois, em agosto de 1954, Bento criava o Departamento de Fronteiras, com autonomia administrativa, diretamente subordinado ao Governador do Estado
O pior erro de Bento Munhoz foi embarcar na aventura de chegar ao governo federal em uma conjuntura volátil e incerta. Desarticular o Departamento do Oeste, que bem ou mal tocava projetos importantes para a região, fez parte desse erro, logo comprovado pela extinção do Departamento de Fronteiras, em 1961.
O conjunto de decisões tomadas por Bento Munhoz para o Paraná e para sua própria carreira política, mirando a Presidência da República ou o cargo de primeiro-ministro na transição para a ordem parlamentarista, danificou sua biografia até então vitoriosa.
O primeiro castigo foi ter a bela cidade com seu nome desmantelada (https://x.gd/RjQby). De resto, o Departamento de Fronteiras parecia uma forma de ignorar a faixa de fronteira, cabível à União.
Mesmo vencido, uma das principais ruas de Cascavel tinha seu nome, mas o fracasso dos planos de Munhoz de chegar ao governo federal lhe valeu perder a homenagem.
A via pública com seu nome foi mudada para “Rua Pio XII” em 1958, quando morreu o papa, célebre por resistir ao nazifascismo e ser o grande inimigo de Hitler.
Depois disso, o governador que criou Cascavel é lembrado só uma vez por ano, por alto, em 14 de novembro, data do aniversário da criação do Município. Em Guaíra e Toledo, que ele também criou, há ruas com o nome de Munhoz.
Só com o aumento dos movimentos camponeses a partir do final da década de 1950 e o primeiro governo Ney Braga (1961/65) o interior do Paraná não ligado a São Paulo (Norte) nem à capital (Sul e Litoral) passou a ser atendido com alguma eficiência pelos governos do Estado e da União.
Quem pesquisa a história do levante de 1924 após consultar várias fontes encontra motivos para dúvidas quando a narrativa chega ao final de setembro, pelas divergências contidas nos relatos.
Dilermando Cândido de Assis contou que os revolucionários ocuparam Foz do Iguaçu no dia 24 de setembro, enquanto o tenente J. Nunes de Carvalho (A Revolução no Brasil) assinala o dia 5 de outubro como o dia da chegada dos rebeldes à cidade.
Dilermando, a rigor, trata mais de sua fuga que da chegada dos rebeldes, posterior à sua retirada. Como o tenente Nunes estava entre os revolucionários que chegaram à Foz do Iguaçu, sua versão é mais confiável.
Provavelmente, Assis calculou que os rebeldes chegariam a Foz do Iguaçu até 24 de setembro, sem contar as dificuldades para o deslocamento de quase 4 mil homens, “as peças de artilharia, toda a munição, a cavalaria e toda espécie de equipamentos auxiliares” (José Augusto Colodel).
João Francisco, que fora promovido a general, reúne-se com os oficiais para discutir a melhor forma de sublevarem os quartéis do Sul.
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