A passagem dos distritos de Cascavel, Guaíra e Toledo à condição de municípios, completada em 1953, quando as câmaras locais começaram as atividades, teve um impacto significativo em cada município em particular e no conjunto da região na forma de atividades combinadas entre vizinhos, inicialmente sob a liderança da Prefeitura de Foz do Iguaçu.
A democracia conquistada em 1946, superando a estagnação dos tempos ditatoriais, teve o verbo modernizar como palavra-chave para a região. Modernidade seriam boas estradas, aeroportos e telefonia, conquistas vitais para escoar a produção, trazer interessados para conhecer as terras férteis da região e ter boa comunicação sem depender de ir a um posto telegráfico e esperar longamente até ser atendido.
Foz do Iguaçu, que pela imensidão de sua área municipal anterior a 1953 pouco atendia às demandas do interior, livre de dois terços de sua área original, pôde concentrar melhor seus recursos nas necessidades da Rota Oeste, especialmente no trecho entre os futuros municípios de Santa Terezinha de Itaipu e São Miguel do Iguaçu.
Dos novos municípios, o de Cascavel era o de maior extensão, entre os rios Iguaçu e Piquiri, “cujas águas fertilizam as terras do Município, proporcionando férteis colheitas”, como ainda hoje consta na bordadura de seu escudo.
Nas eleições de dezembro de 1952 só os ex-distritos escolheram prefeitos. Foz do Iguaçu prosseguiu sob a direção do ex-presidente da Câmara, Francisco Guaraná de Menezes, eleito excepcionalmente para a Prefeitura iguaçuense em 1951.
O prefeito de Foz do Iguaçu ajudou extraordinariamente a gestão dos novos municípios durante o ano de 1953, quando nas áreas emancipadas ainda havia obras em andamento e equipamentos em serviço pertencentes ao Município de origem.
Em julho de 1954, quando o prefeito Menezes assinou a lei 137, chamou a atenção dos novos prefeitos para a necessidade de apoiar as atividades dos munícipes, com incentivos atraentes para os produtores rurais nessa época em que só se falava na indústria madeireira.
A lei 137 autorizava a Prefeitura a importar máquinas e veículos “para serem cedidos a preço de custo aos agricultores, criadores e colonizadores estabelecidos neste Município”. Era uma forma de evitar as barreiras e obstáculos que dificultavam as importações na época.
Atendendo ao propósito de modernização, a medida puxou uma série de novas leis, em toda a região, para focar na diversificação agrícola. O comandante da colonização do novo Município de Toledo, Willy Barth, ficou horrorizado com os relatórios que indicavam o interesse maciço dos agricultores que se estabeleciam na antiga Fazenda Britânia pela produção de café.
As fortes geadas do inverno ensinaram que produzir café ao Sul do Rio Piquiri era extremamente arriscado, devido às condições climáticas mais desfavoráveis que ao Norte.
Modernizar, para Cascavel e Toledo, que não tinham a comunicação fluvial de Foz do Iguaçu e Guaíra, era motivar companhias aéreas a promover voos regulares ao Médio-Oeste. Para isso era preciso ter aeroportos.
A democracia havia trazido eleições livres, mas ainda não havia o clima rancoroso da polarização em que os grupos políticos se insultam e se agridem, causando inimizades. As comunidades se uniam na hora de resolver problemas.
Foi com a união da comunidade que Cascavel inaugurou seu aeroporto em janeiro de 1953 e no mês seguinte Toledo também providenciou o seu.
Em Cascavel, foram alguns dias de trabalho coletivo, mas em Toledo foram horas. Assim que a equipe de topografia definiu o traçado do aeroporto, de imediato foram deslocados ao local três tratores e uma motoniveladora, com seus operadores e tambores de óleo.
“Montaram barracas de lona sob as quais improvisaram fogões, algumas mesas, bancos”, contou o historiador Ondy Niederauer. “Era quase como um restaurante de campanha. Diversas senhoras passaram a revezar-se nessa cozinha. Os homens, deixaram seus serviços na cidade e vieram ao local, ajustando-se cada um no que podia ajudar”.
Quando começou a escurecer, o eletricista Otto Clajus pediu emprestado ao agricultor Friedrich Isenberg um motor Volkswagen ainda zero km, trazido da Alemanha. “Otto montou este motor na carroceria do seu jipe, juntou-lhe um gerador, e tinha assim uma pequena usina portátil” (Ondy Niederauer).
O trabalho começou na manhã de sexta-feira, 20 de fevereiro de 1953, e acabou ao meio-dia de domingo, dia 22.
“Tinham sido dois dias e meio e duas noites, num total de 52 horas, e lá estava uma pista de 70 por 1.200 metros, novinha em folha, sendo admirada carinhosamente pelos orgulhosos toledanos de então”, escreveu Niederauer.
A tarefa que vinha depois não era braçal, mas cerebral: convencer empresas aéreas a iniciar uma rotina de voos, pois os aeroportos construídos com tanto empenho só eram usados eventualmente por táxis-aéreos.
Só em 17 de agosto de 1954 a mágica toledana voltou a acontecer. O avião Douglas DC-3, dos Serviços Aéreos Cruzeiro do Sul, sobrevoou a cidade e aterrissou no aeroporto, como também ocorreu em Cascavel
“Toda a cidade acorreu para ver o avião pousado no solo toledano”, narrou o historiador Niederauer. “Era um voo inaugural, que ligava Toledo a Curitiba e tinha como passageiros, diretores da empresa e, até algumas pessoas de nossa cidade, inclusive membros da Diretoria e do Conselho Fiscal da colonizadora Maripá”.
O exemplo de união que se verificava em Toledo e Cascavel estava na contramão da absurda Guerra Fria, que dividiu o país e manteve o Brasil no atraso.
As tensões chegaram ao ponto culminante em janeiro de 1954, quando o ministro do Trabalho, João Goulart, anunciou estudos para dar bom poder de compra ao salário mínimo. Os trabalhadores mobilizados exigiam 100% de reajuste, mas os empresários só aceitavam 42% e igualmente se mobilizaram, tentando evitar o salário dobrado.
A ofensiva contra o governo começou, abertamente, em 8 de fevereiro de 1954, quando 81 oficiais do Exército enviaram ao ministro da Guerra o Manifesto dos Coronéis, escrito por Golbery do Couto e Silva (1911–1987), que dez anos depois iria derrubar o presidente João Goulart.
Um polêmico acordo militar firmado entre Brasil e EUA no início da década proibia a venda de matérias-primas de valor estratégico aos chamados “países socialistas”, liderados pela antiga URSS.
Getúlio Vargas não cumpriu a imposição, “vendendo ferro à Polônia e Tchecoslováquia, em 1953 e 1954, a preços muito mais altos do que os que pagavam os Estados Unidos” (Eduardo Galeano, Veias Abertas da América Latina). A iniciativa lhe valeu a inimizade agressiva dos EUA.
Se no país aumentava a tensão entre civis e militares, abalando a democracia recentemente conquistada, no Oeste as tensões corriam por conta dos choques entre jagunços e posseiros.
A Gleba Rio Verde, adquirida em 1954 pela Sociedade Imobiliária Noroeste do Paraná (Sinop) junto ao governo do Paraná, foi, em si mesma, uma aquisição legal e legítima. Isso não impediu a empresa de enfrentar dissabores devido a ocupações anteriores em algumas áreas, promovidas por posseiros.
A Sinop considerou então legítimo recorrer aos “homens-segurança”, os chamados jagunços. Para fazer a proteção do local, montou um acampamento principal nos Três Olhos (Estrada Olinda), onde seus homens armados interceptavam todos os veículos e transeuntes que tentavam entrar no local.
Teriam que se identificar e dizer de onde vinham, para onde iam, fazer o quê, especificar o local exato de suas visitas e declarar o dia exato do regresso.
“Se não voltassem no dia previsto, os jagunços iam atrás. Os forasteiros vinham para tomar posse de terras, daí a razão de serem interceptados na estrada trancada pelos jagunços” (Selene de Carvalho, Alceu e Regina Sperança, Ubiratã, História e Memória).
Logo os jagunços envolvidos em crimes fugiam para não ser presos, mas os demais viram vantagem em requerer terras para a família trabalhar nas atividades agropecuárias que viam prosperando à sua volta.
Na propriedade de Allica, ao Norte do futuro Município de Cascavel, cerca de mil mensus viviam em regime de escravidão.
Cabanas os libertou depois aplicar uma “surra de espada” no capataz Santa Cruz, cunhado de Allica. O capataz e seus jagunços foram expulsos do local e cerca de 200 mensus se juntaram ao 6º Batalhão de Caçadores.
Os revolucionários também conquistaram a adesão do pessoal da companhia Mate Laranjeira, concorrente de Allica, que operava portos na região.
No Sul, a preparação para o levante se acelerava. Prestes e os rebeldes gaúchos o marcaram para 29 de outubro, quando os governistas já enfrentavam os rebeldes paulistas no Oeste do Paraná.
O revolucionário gaúcho Eduardo Agostini, que decidiu ficar na região do Depósito Central, onde seria um dos fundadores da cidade de Santa Tereza do Oeste, contou (https://x.gd/z4Xgc) que o primeiro combate do qual participou foi na Rocinha, perto de Catanduvas.
– As forças legalistas de São Paulo atacaram a Rocinha, mas não deixamos eles entrar (...) Ali foi baleado um soldado da Polícia de São Paulo e aí alguém disse: “Olha, vem um batalhão para cortar a retaguarda de vocês, comandado pelo capitão [Joaquim] Sarmento”. Newton Estillac Leal ordenou o recuo a Catanduvas, para não sermos sitiados na Rocinha.