Na década de 1950, juiz algum queria assumir a Comarca de Cascavel devido ao clima tenso e à criminalidade reinante. Quando foi cogitado para vir a Cascavel, o juiz Aurélio Feijó disse que só viria se houvesse uma escola de grau médio para seus filhos.
Um dos principais líderes cascavelenses, Alceu Barroso, criador do Banco Agrícola Vale do Rio Piquiri (Banquiri), decidiu atender à exigência do juiz. O Banquiri tinha muito interesse em que as questões legais começassem a se resolver na lei e não na bala, por meio de jagunços.
Assim, Barroso entrou em contato com um professor que ele conheceu no interior paulista. Antônio Cid, na época, lecionava em Santo Antônio da Platina. Sem conhecer a cidade, Cid concordou em vir a Cascavel para criar a escola, convencido por Barroso de que a região tinha grande potencial.
Cid nasceu em Santa Cruz do Rio Pardo (SP) em 28 de janeiro de 1924, e veio para Cascavel em 27 de abril de 1954, aos 30 anos.
“Quando cheguei, notava-se, além dos poucos moradores que aqui existiam, um aglomerado de 80 a 100 casas, ali por volta da atual Praça Getúlio Vargas, que era considerada o centro da cidade”, recordou Cid.
“O que mais se via por aqui era gente mal-encarada. Em consequência da procura das terras e da defesa dessas terras é que se via por aqui muito jagunço, muita gente armada”.
Como uma escola não surge automaticamente, o juiz Aurélio Feijó veio em junho para assumir o Fórum da Comarca, mas devido à inexistência de uma escola já funcionando ficou apenas um mês em Cascavel e pediu remoção.
Sua contribuição foi ter motivado o interesse por uma escola de grau médio. Cid de imediato se entrosou com a comunidade, mas a escola não viria tão cedo.
Com o compromisso de construir a escola, Cid ganhou uma ampla área no Patrimônio Novo de Cascavel – a parte da cidade que segue da atual Rua Sete de Setembro em direção ao Leste.
Eram terras do Estado reservadas para edificações públicas. O fato de a área ser pública e a escola de Cid ser particular era uma situação a ser resolvida assim que ela viesse a funcionar.
Cid não tinha recursos para fazer a escola nas condições que o Ministério da Educação exigia. O governador Moysés Lupion o aconselhou a vender a área excedente para financiar a obra: “Você tem aquela área grande lá, vende um pedaço dela [...] pega o dinheiro e joga aí” (depoimento a Paulo Roberto Krüger, https://x.gd/mmmeJ)
Em meio às tratativas para viabilizar a escola, Cid sofreu um drama familiar. No final de 1954 seu filho José Augusto apresentou um quadro de retardamento mental acompanhado de traumatismo nos membros inferiores. Sem condições de tratar o menino em Cascavel, correu para São Paulo, mas nem lá conseguiu reverter o quadro.
Só em 1956 o professor conseguiu completar as obras da escola. Em madeira, na atual Rua Paraná, esquina com a Travessa Padre Champagnat, tinha quatro salas de aula.
O estabelecimento abrigava o Ginásio Rio Branco e a Escola Técnica de Comércio, oficialmente reconhecido pelo Ministério da Educação e Cultura em 12 de março de 1957.
Chegava a hora de regularizar a posse da área junto ao Departamento de Geografia, Terras e Cartografia do Estado (DGTC), que cedeu as terras para a formação do Patrimônio Novo da cidade de Cascavel.
O requerimento nesse sentido deu entrada no DGTC em maio. Declarava o uso da área de 25.106m² na Reserva II, originalmente destinada à construção de um grupo escolar, tendo ali construído sua Escola Técnica de Comércio Rio Branco investindo um milhão de cruzeiros (moeda extinta em 1967).
Além do professor Cid, lecionaram naquela escola os professores Celso Formighieri Sperança, primeiro secretário municipal da Educação, e o advogado José Bernardo Bertoli, proprietário da Rádio Colmeia.
Quando a Comarca foi “despejada” de seu prédio alugado, o professor Cid acolheu o Fórum em sua modesta escola: “Como não havia outro lugar para se colocar, na minha escola eu tinha duas salas disponíveis, cada uma com 48 metros quadrados”.
A Prefeitura, então localizada diante de sua escola, sofreu um incêndio criminoso em dezembro de 1960 e Cid também ofereceu parte das instalações para atender às necessidades do Município até a construção de um novo prédio.
Por conta disso, em 1961 a Escola Rio Branco foi declarada de utilidade pública pelo Município de Cascavel e passou a receber uma “subvenção anual”. Era o início do processo de absorção do educandário, então particular, pelo Município.
Os Irmãos Maristas planejavam vir para Cascavel desde 1956, quando rejeitaram uma área oferecida pela Prefeitura. Com a absorção do Rio Branco pelo Município, em janeiro de 1962 o irmão marista Carlos Leone recebeu da Prefeitura a proposta de instalar ali o seu colégio.
O Colégio Marista recebeu o patrimônio das escolas do professor Cid em troca da área doada em 1956 à congregação pelo prefeito José Neves Formighieri. Assim, os Irmãos Maristas passaram a lecionar no antigo Rio Branco e o Município construiu na antiga área dos padres o Estádio Municipal Ruy Gândara (depois Ciro Nardi).
Em março de 1964, um golpe civil-militar depôs o governo de João Goulart, amplamente apoiado em Cascavel, de históricas raízes getulistas. A Prefeitura, que havia conduzido a transferência do Colégio Rio Branco ao Colégio Marista na base de entendimentos entre as partes, viu-se na necessidade de formalizar o ato.
Em setembro, a lei 292/64 autorizava oficialmente a transferência à Associação Brasileira de Educação e Cultura de todos os direitos relativos ao Ginásio Rio Branco, “independentemente de qualquer indenização”.
Aparentemente a situação estava esclarecida: Cid criou sua escola em área pública cedida pelo Estado, teve autorização do governo Lupion para vender parte da área para financiar as obras do colégio e entregou a escola à Prefeitura, que por sua vez a repassou aos Irmãos Maristas.
Na cena nacional, o propósito dos golpistas ao derrubar João Goulart em 1964 era sanear o país e normalizar a vida pública brasileira. No entanto, houve uma guerra interna entre os militares no poder e em dezembro de 1968 se deu um golpe dentro do golpe (https://x.gd/lxykF), com o qual a ditadura se escancarou de vez no país e se arrastaria por duas décadas.
Uma onda de perseguições, prisões e mortes se deu na sequência desse novo golpe, marcado pela imposição do AI-5. Vários líderes cascavelenses foram presos e alguns conseguiram fugir para outras regiões e países. Dos que ficaram, o mais prejudicado foi o professor Antônio Cid.
O golpe sofrido por Cid se deu em 15 de setembro de 1969, quando um decreto dos ministros militares, que governavam o Brasil na ausência de um presidente eleito, anulou as vendas de bens feitas pelo professor e os confiscou.
A anulação também prejudicou as pessoas que haviam adquirido bens transferidos por Cid, dentre os quais o arquiteto Gustavo Gama Monteiro, que idealizou a Avenida Brasil e finalizou o projeto da Catedral, e o ex-vereador cascavelense e primeiro prefeito de Corbélia, Julio Tozzo.
A situação pessoal de Cid então chegou ao estado de penúria. Ser perseguido pela ditadura equivalia a um atestado de banditismo. Tentando crédito para comprar alimentos para a família, o professor ouviu de um supermercadista que só levaria as compras pagando à vista.
“Eu tinha ele como um dos grandes amigos meus, me respondeu assim”, lamentou Cid em depoimento a Paulo Roberto Krüger. Proibido de lecionar e com o crédito cortado, Cid ficou magoado com pessoas amigas que evitavam até conversar com ele.
Com a redemocratização do país, já plenamente reabilitado das injustiças e perseguições sofridas, Antônio Cid também foi chefe de gabinete do prefeito Salazar Barreiros, nomeado em 1990. Casado com Lycinia Augusta Domingues Cid, teve com ela cinco filhos. Morreu em 24 de janeiro de 2020.
Entre os dias 25 e 31 de janeiro de 1925 a coluna guerrilheira gaúcha atravessou o Rio Uruguai em Porto Feliz, entrando em Santa Catarina.
“As matas dos rios Uruguai e Iguaçu são talvez as mais densas do Brasil, não se podendo marchar a não ser através de picadas abertas a facão”, testemunharia Luiz Carlos Prestes. “Era difícil fazer com que os homens andassem pela mata mais de três ou quatro quilômetros por dia”.
No dia 27 de janeiro os tenentes Carlos Abreu dos Santos Paiva e Mário Portela Fagundes morreram ao combater o 6º Corpo Auxiliar do Rio Grande do Sul. Atravessando o Rio Iguaçu, alcançaram Barracão em 7 de fevereiro.
“Infelizmente, não pude aqui chegar com os 1500 homens que saí de São Luiz”, lamentou Prestes. “Alguns chefes retiraram-se, levando consigo, criminosamente, homens, armas e munição”. Mais de 200 homens desanimaram, após nove léguas de picada, e igualmente abandonaram a coluna, passando para a Argentina.
“Tivemos que lutar mais com a fraqueza e desânimos de certos companheiros do que com o próprio inimigo, pois este, com a rapidez dos nossos movimentos, ficou impossibilitado de fazer a mais insignificante das perseguições.”
“Enfim, apoiado no valor, dedicação e abnegação de quatro amigos e companheiros, somos aqui chegados. São eles Siqueira Campos, João Alberto, Cordeiro de Farias e Portela Fagundes. Estamos com 800 homens, dos quais menos de 500 armados e, tendo ao todo cerca de 10 mil tiros; possuímos 10 fuzis metralhadoras” (relatório ao marechal Isidoro Dias Lopes).