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A Saga: a história que virou o século

No crepúsculo do milênio começou a ser escrita a obra-prima de Manaoos Aristides, que levou 13 anos entre o filme original e a série na TV

Por: Time de redação Fonte: Alceu Sperança
20/04/2025 às 10h50
A Saga: a história que virou o século
Em A Saga, o herói Audálio dos Anjos (Vitti) presta socorro. Acima, o diretor Manaoos Aristides, Roberto Bomtempo e Olga Bongiovanni. Abaixo, Valdir Fernandes, Raymundo de Souza e o DVD de A Saga

“No crepúsculo do milênio/ seus filhos e herdeiros /ao tocar os sinos virão / eis a Saga / sonho sem fim”. A letra em Portunhol da canção de Artur de Carvalho, parte da trilha sonora do filme “A Saga”, remonta à obsessão do diretor Manaoos Aristides de criar um filme épico sobre a história do Oeste do Paraná.

Com esforço, desafiando todos os obstáculos, o projeto começou no fim do século XX, em 1999, atravessou a passagem do milênio, parecia não ter fim e só se completou ao cabo de treze anos, em uma minissérie com 16 capítulos repletos de história e romance, cada qual com cerca de uma hora de duração.

Ao longo desse tempo a maioria dos projetos se dispersa, mas A Saga persistiu, estendendo-se por dezenas de cidades e mobilizando cerca de cinco mil pessoas – equivalentes à população de Lindoeste.

Manter a equipe unida na aventura de adaptar histórias, adequar personagens e manter atores por período superior ao de uma novela foi uma façanha sem igual, resultando em uma experiência rara na dramaturgia nacional. “Uma saga dentro da Saga”, como a descreveu o diretor e roteirista Manaoos Aristides.

De fato, ela não teria sido possível sem sua própria saga pessoal, iniciada no curso de Artes Cênicas da Universidade Federal do Amazonas, em 1970.

Apresentado ao Oeste

Concluindo a formação em 1974, Aristides começa seu preparo na TV e cinema com cursos de iluminação, produção e direção. Em 1977, faz o curso de criatividade da Universidade Búfalo (EUA) pela Rede Globo. Fez vários cursos de cinema e televisão, passando pela TV Cultura de São Paulo.

Além de experiências no jornalismo no Jornal do Commercio e TV Cultura do Amazonas, seu contato com a história é de longa data, pois foi professor dessa matéria. Em São Paulo, foi diretor de produção na TV Globo e diretor na mesma emissora no início dos anos 1980.

O primeiro contato com o Oeste do Paraná se deu em 1984, como diretor de criação e produção da TV Tarobá. Depois fez documentários e até videoclipes com vários artistas para o Fantástico, da Globo, e em 1997 foi chamado para ser o diretor de programa do Festival de Parintins, um dos mais importantes do país.

Experiência não faltava, de Norte a Sul do país, para saber que produzir “A Saga” fora do eixo Rio-São Paulo seria uma aventura atrevida, mas a longa trajetória de Manaoos Aristides lhe garantiu amigos que aceitaram o desafio de apresentar ao Brasil o extraordinário manancial de emoções da história do Oeste paranaense.

Amigos como Jorge Fernandes Guirado, que depois de obter êxito na programação da TV Tarobá, passou a liderar o Grupo Catve e participou desde o início do projeto.

Está claro: não é documentário

O que Aristides imaginou, porém, excedia o filme de longa metragem iniciado em 1999, tornado a base para a minissérie com 16 capítulos transmitidos pela TV Brasil entre 2014 e 2017 (https://x.gd/598y4).

Apesar da profusão de fatos, datas e caracterizações de personagens históricos, A Saga não é um documentário. A história é o veículo pelo qual transitam as aventuras e paixões dramatizadas de um personagem fictício – Audálio dos Anjos.

Inspirado em uma personalidade real, Sandálio dos Santos (https://x.gd/U9jzS), que dá nome à biblioteca pública de Cascavel, Audálio, na idade adulta, vai se distanciar da biografia de Santos e aprofundar a ficção.

Só os atores que interpretam Audálio na infância e juventude, respectivamente Daniel Lange e Adilson Girardi, viveram no filme episódios reais vividos por Santos. O adulto Audálio é interpretado pelo ator global João Vitti (https://x.gd/n9BR5).

A imagem heroica de Audálio é construída a partir da realidade, como se vê no segundo e terceiro capítulo de A Saga, mas a partir daí história vai se adequar ao romance.

Bomtempo, desempenho marcante

Nome consagrado no circuito cinema/TV, o ator Raymundo de Souza (https://x.gd/84DZh) viveu o fundador da cidade de Cascavel, Jeca Silvério. No primeiro capítulo de A Saga ele aparece na velhice contando os primórdios da história do Oeste ao menino Gabriel, que se interessa pela história.

Em A Saga, o personagem Nhô Jeca é o coadjuvante de Audálio dos Santos, licença tomada por Manaoos Aristides para que a ficção pudesse fluir entre o heroísmo de Audálio e o romance que no capítulo 5 se desenvolve com seu casamento com Laura (Suzana Pilon), distanciando-se definitivamente da biografia real de Sandálio dos Santos.

As cenas iniciais com a presença do carismático ator Roberto Bomtempo (https://x.gd/7q9jR) interpretando o espanhol Cabeza de Vaca na descoberta das Cataratas do Iguaçu e na premonição sobre Itaipu foram decisivas para dissipar qualquer impressão errônea de que se tratava de um documentário.

Valdir Fernandes (https://x.gd/LNmlF), que interpretou Padre Germano, veio precedido pela força de seus papéis nas novelas mais marcantes da TV Bandeirantes – Meu Pé de Laranja Lima (1980) e Os Imigrantes (1981).

Seu papel em A Saga foi relevante para o conjunto da história. No capítulo 11, por exemplo, ele, Nhô Jeca e Audálio dos Santos ajudam uma família cuja filha foi raptada por um índio, dramático episódio realmente acontecido. O raptor real foi preso pelo verdadeiro Sandálio dos Santos.

Antes do Country Clube

Alguns personagens marcantes foram desempenhados por gente da comunicação e da sociedade cascavelense não exatamente ligados à TV ou ao cinema. Olga Bongiovanni, ex-vereadora e renomada apresentadora de rádio e TV, faz o papel de Madame Hortência, a dona de um bordel.

Aliás, a casa de tolerância, nos tempos pioneiros, não era necessariamente um antro de imoralidade. Era um precursor do Country Clube, ponto de encontro onde muitas decisões eram tomadas. A ficção de Aristides deixa isso bem claro, como no capítulo 7 da minissérie, na qual aparece o líder revolucionário Luiz Carlos Prestes (Danilo Faro).

Outros comunicadores de sucesso também atuaram em A Saga, casos de Amir Kali (Giovani) e Ivan Luiz (juiz eleitoral). O animador Ivan Taborda representou facilmente o Gaudério Antunes. Hoje presidente da Academia Cascavelense de Letras (ACL), o músico e ator Cleiton Costa representou o Índio Miguel. O advogado Leocádio Lustosa fez o revolucionário Siqueira Campos e o artista plástico Nelson Josefi representou Gaudêncio.

No capítulo 6, Aristides destaca sedutoras personagens inspiradas na peça teatral As Vivandeiras, de Alceu A. Sperança, premiada pela Funarte em 2004.

Manaoos Aristides procura contemplar todos os personagens mais relevantes da história, mesmo distantes do tempo ficcional de seu romance. Seguindo a orientação de distanciar a ficção da história real, para que ninguém a tome como documentário, no capítulo 8 o governista Dilermando de Assis (Igor Rickli) consegue prender centenas de rebeldes comandados por João Cabanas, coisa que nunca aconteceu.

A minissérie capta, assim, um sonho de Assis, que pretendia de fato prender os revolucionários, mas fugiu de Foz do Iguaçu antes que eles chegassem ao Oeste.

Ficção x história 

No capítulo 12, o diretor encontra uma forma de contar a aventura do tenente Firmino (Eddy Silva, que também se destaca na montagem dos efeitos especiais), importante personagem real, recorrendo às memórias históricas do narrador Terêncio Goulart, personagem fictício que representa o pioneiro vindo para a região na Marcha para Oeste.

Os capítulos finais permitem à ficção se afastar ainda mais da história real para dar um panorama geral da marcha dos colonos ao Oeste. No episódio 16 a peça de resistência é a equilibrada eleição de 1952, em que o prefeito José Neves Formighieri venceu Tarquínio Santos por um voto.

O episódio foi romanceado na minissérie como a derrota de Audálio dos Anjos por um voto para o fictício Samuel Bernardes, vivido por Francimar Alves Müller (https://x.gd/9ZPIK).

Nenhum historiador poderá se queixar de um documentário que não houve e o espectador pôde se deliciar com a ficção sem correr o risco de confundi-la com a história real. De qualquer forma, as “narrativas” costumam sobreviver aos fatos, tornando-se um “sonho sem fim”, como canta a música-tema de A Saga (https://x.gd/u2O3h).

100 anos da revolução: A sina de quem se rendeu 

Apesar da promessa de serem tratados como dignos soldados do Exército Brasileiro, os rebeldes que se renderam em Catanduvas tiveram um destino cruel. Foram levados para Clevelândia do Norte, no Oiapoque do Amapá, extremo Norte do Brasil, onde foi criada uma colônia penal para isolar os “agitadores” e “subversivos”, geralmente militares revolucionários pequeno-burgueses, anarquistas e comunistas.

Os primeiros navios-prisão lotados de prisioneiros começam a chegar a Clevelândia do Norte, levando pessoas que o governo considerasse perturbadores da ordem. Foram submetidos a duras condições de sobrevivência, sendo vítimas de violência policial, epidemias, trabalhos forçados e fome.

Após a rendição em Catanduvas, os revoltosos paulistas que escaparam ao cerco trataram de retardar o avanço governista sobre o eixo Catanduvas–Cascavel–Benjamin–Foz do Iguaçu, a fim de permitir a junção com a coluna gaúcha que tendo transposto o Rio Iguaçu marchava para o entroncamento de Benjamin.

A missão impunha a organização de resistências sucessivas. Comandava a força de cobertura o capitão Juarez Távora. A primeira dessas resistências foi organizada na região de Rio do Salto, a fim de garantir o escoamento dos elementos que se retiravam de Centenário. 

A Prisioneiros chegando em 1925 ao campo de concentração em Clevelândia do Norte (AP), o “inferno verde”

 

 

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Alceu Sperança
Alceu Sperança
Jornalista e escritor.
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