O junho mais quente da história

“Não passarão”: agricultores fecharam a BR-277 nos protestos conhecidos como “O Levante da Soja”.

O junho mais quente da história

“Não passarão”: agricultores fecharam a BR-277 nos protestos conhecidos como “O Levante da Soja”.
Na década de 1980, muitos protestos de agricultores. A primeira solução concreta só veio em 1995

Em 16 de junho de 1989, produtores e trabalhadores rurais unidos paralisaram parcialmente a BR-277, como aviso ao governo, abrindo os protestos que passaram à história como “O Levante da Soja”. Sem ser atendidos, os manifestantes então bloquearam completamente a rodovia no dia 19.
No dia seguinte as cooperativas da região anunciaram a paralisação total do comércio de soja. Ao contrário de protestos anteriores, em atos de poucas horas, no dia 22 o movimento chegou ao clímax, com a queima de uma colheitadeira na pista bloqueada da BR-277.
Durante a Década Perdida, como os anos 1980 ficaram conhecidos, nas cidades os trabalhadores, industriais e comerciantes sofriam porque a ditadura deixou a economia arrasada. No campo, a agropecuária pagava as contas do fracasso governamental, cujo anunciado “milagre” não passava de picos de crescimento curtos: os “voos de galinha”.
O governo de José Sarney, reunindo moderados do antigo regime e centristas do MDB, continuava, como a ditadura, a privilegiar transnacionais, atravessadores e contrabandistas, prejudicando os agricultores.
Ano do centenário da República, 1989 começou com o Plano Verão e uma nova moeda no país: o Cruzado Novo. Diante de mais sacrifícios, no trepidante inverno desse ano o campo decidiu enfrentar o governo sem mais tréguas.

O começo da pressão

Uma longa história de sofrimento e crise já havia passado desde que a confiança dos ruralistas nos ditadores se desfez, na década de 1970. Atos de protesto contra a política de submissão às transnacionais do agronegócio vinham crescendo desde abril de 1980, com o repúdio dos agricultores a um pernicioso imposto de exportação.
Mais promessas e medidas insuficientes depois, em 2 de julho de 1983 acontecia em Cascavel um grande tratoraço, com a presença de três mil sojicultores. “Meio assustados, os comerciantes lojistas aplaudiam o ronco dos motores de quase cem tratores que subiam a Avenida Brasil” (Jornal Nosso Tempo).
Em manifesto, os sindicatos rurais e cooperativas reiteravam seu “repúdio à inconsequência e irresponsabilidade de que se têm revestido as decisões oficiais relativas ao setor”.
No texto, escrito pelo advogado Wilson Carlos Kuhn, ex-prefeito de Toledo, alertavam para o caos que seria a “interrupção no processo produtivo”, a menos que uma série de medidas corretivas fossem aplicadas, começando pela “extinção de todas as práticas imediatistas e de improvisação”.
Sugeria uma política agropecuária de longo prazo, “com a participação ativa das classes produtoras”, contemplando valores básicos de custeio, preços justos e crédito rural. No entanto, só medidas paliativas e sem eficácia foram tomadas até que em 21 de junho de 1985 cerca de oito mil agricultores saíram das lavouras e ocuparam as principais rodovias do Oeste para protestar.

Importando carne e milho

O último ditador, general João Figueiredo, abandonou o governo em março sem deixar qualquer política econômica organizada. Sem planos, José Sarney assumiu a presidência devido à enfermidade que afastou o presidente eleito pelo Congresso, Tancredo Neves.
Os protestos maiores de 1985 no Oeste se deram em Palotina, considerada a “capital nacional da soja”, onde 3.500 agricultores e centenas de máquinas agrícolas interditaram as vias de acesso à cidade. O movimento insistia em reformas profundas no médio prazo. De imediato reclamava “juros diferenciados”.
Além do sufoco financeiro, a estiagem de 1985 comprometeu 50% da produção. O Brasil entrou em 1986 fazendo o inimaginável: importando carne, arroz e milho. Nesse desastre total, prometendo domar a inflação que comia os salários, o Plano Cruzado foi recebido com alegria.
O congelamento de preços, reajuste de salários e corte de três zeros na moeda parecia o céu, mas os sinais de que algo estava errado apareceram quando os “fiscais do Sarney” saíram às ruas para atacar quem aumentasse os preços.

Faltou a picanha

Os agricultores foram os primeiros a gritar socorro: os juros do financiamento agrícola, que antes eram de 3% ao ano mais a inflação, passaram a 10% em um ambiente de inflação zero.
Em 5 de julho os frigoríficos da região anunciaram a suspensão dos abates porque não havia gado. Nem picanha, nem pelanca. O governo culpou os agropecuaristas de boicotar a entrega de gado aos frigoríficos.
Em 8 de agosto, com câmeras filmando, é desencadeada a Operação Boi no Pasto, apoiada por helicópteros, querendo flagrar boiadas escondidas.
Os produtores avisaram que esse teatro ia piorar tudo: “Medidas como o confisco não vão disciplinar os preços do mercado nem suprir a falta generalizada de alimentos”, reagiu Wilson Kuhn.
Era preciso “uma política agrícola e pecuária duradoura e coerente, sem o inconveniente das improvisações”, com volume de crédito maior para o plantio, preços condizentes e segurança agrícola.
Os agricultores novamente não foram ouvidos e em setembro de 1986 avisaram que já faltavam insumos para a safra de verão. As indústrias de fertilizantes e defensivos alegavam não dispor de matérias-primas.

Propaganda disfarça a realidade

Os preços eram abusivos e só se conseguia os produtos pagando ágio. As importações generalizadas dispararam, mas a propaganda do Plano Cruzado como salvação nacional deu a vitória ao governo nas eleições de novembro.
Só depois veio o choque de realidade: o governo reconhecia que o Plano Cruzado fracassou, obrigando um segundo plano com minidesvalorizações e elevação de preços de vários produtos, como 60% para os combustíveis.
Mas nem o Plano Cruzado II serviu aos agricultores e em 27 de novembro de 1986, em Brasília, no primeiro grande protesto pós-ditadura, caiu a ficha do estelionato eleitoral cometido pelo governo.
Em fevereiro de 1987 os produtores ocuparam novamente o centro de Cascavel com colheitadeiras e tratores para exigir medidas corretivas. Em 10 de março, quase em operação de guerrilha, fecharam as agências bancárias para exigir a redução de juros.

A lista dos “agitadores”

Quem estivesse nas ruas de Cascavel teria visto os “agitadores” fechando bancos e correndo risco de prisão, caso do líder empresarial Romeu Morais, que trancou o Banco do Brasil.
Os demais bancos foram fechados por Francisco Salvatti, Edgar Tochetto, José Gaio, Artur Bueno, João Ramiro, Claudionor Ebling, Pedro Lupatini, Danilo Scanagatta e outros diretores dos sindicatos rurais, Coopavel, Cotriguaçu e Sociedade Rural do Oeste.
Vieram os planos Bresser (06/1987) e Verão (01/1989), mas os agricultores estavam longe de se acalmar. Por isso o mês de junho de 1989 foi quentíssimo e deu início ao Levante da Soja.
As cooperativas do Oeste paralisaram totalmente a comercialização em protesto contra os baixos preços da soja. Em apoio, as indústrias paralisaram a produção de óleo. Cerca de 500 agricultores bloquearam a BR-277 e o movimento prosseguiu por toda a segunda quinzena do mês, inclusive com a queima de uma colheitadeira na pista da rodovia federal, em 22 de junho.
O governo se recusando a negociar era como se a ditadura continuasse, apesar da nova Constituição. Enganado pelo discurso populista de Fernando Collor de Mello, o país o elegeu e foi traído em 1990 por um plano que aumentou a correção monetária dos contratos de financiamento agrícola, atormentando os agricultores com dívidas junto ao Banco do Brasil.

Fórmula da vitória

Houve bloqueio de ativos financeiros, inadimplência, congelamento de preços e redução na renda dos agricultores. Collor foi forçado a renunciar em 1992. O presidente Itamar Franco assumiu disposto a concretizar a democracia constitucional e os agricultores conseguiram renegociar dívidas na Justiça.
Em 1993, Itamar começa a aplicar o Plano Real, que vai domar de fato a inflação, na altura de 4.922% em julho de 1994. Surfando na positividade do plano, elege-se à Presidência um ex-ministro de Itamar – Fernando Henrique Cardoso, cuja propaganda o anunciava como o “pai do Real”.
No entanto, Cardoso não tinha uma política definida para a agricultura. Em março de 1995, em último esforço articulado, os agricultores do Oeste protestaram em massa contra as distorções que levavam a agricultura à falência.
Dez mil produtores voltavam a bloquear as agências bancárias pedindo providências. Fortalecidos por décadas de lutas, os agricultores finalmente venceram: conseguiram a renegociação da dívida com 25 anos de prazo para pagar, com base no preço mínimo do milho.
A receita dessa conquista foi unir produtores e trabalhadores, pressionar o governo respeitosamente, com reivindicações bem formuladas, e sempre recorrer à Justiça. Com o país desunido e a Justiça sob desconfiança ficará difícil obter novas vitórias sobre o “sistema”.

100 anos da revolução: Perseguição intensa

Prestes desenhou a fórmula para sair do cerco do general Rondon, baseada em retomar Guaíra com a combinação de dois destacamentos. Um seguiria pelo Rio Paraná no vapor Assis Brasil, rebocando uma chata. O outro iria por terra, pelas picadas às margens do rio.
No entanto, os rebeldes trombaram na resistência dos soldados legalistas comandados pelo eficiente coronel Mário Tourinho a nove quilômetros da vila. Foram também atacados pela retaguarda, na região do Rio São Francisco, por dois destacamentos.
Só havia uma solução para os revolucionários: atravessar o Rio Paraná em Porto Artaza e Porto Mendes, desde que afastando os soldados legalistas da região. A tarefa coube a João Cabanas, que desejou ir além: não só afastar os governistas, mas também combatê-los.

Mário Tourinho não caiu na armadilha de Prestes

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