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Elias Zydek:O desafio do leite em transformação

“A crise que assola o setor está diretamente ligada à dinâmica global de oferta e demanda.”.

08/11/2025 às 13h43
Por: Tissiane Merlak
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Elias Zydek:O desafio do leite em transformação

Engenheiro agrônomo com especialização em planejamento e gestão de negócios, Elias Zydek é um dos líderes mais experientes do cooperativismo e da agroindústria paranaense. CEO da Frimesa, cooperativa central que nasceu da intercooperação para agregar valor às cadeias do leite e da suinocultura — e hoje figura como o quarto maior player do Brasil e primeiro da suinocultura do Paraná e a segunda do estado em laticínios —, ele também está no Conselho Consultivo da Embrapa Suínos e Aves, é diretor do Sistema Ocepar e conselheiro regional da Fiep. Zydek acaba de a presidência do Sindicato das Indústrias de Laticínios do Paraná (Sindileite), em um momento de forte crise no setor leiteiro estadual, a segunda maior bacia do país, pressionado pela queda nos preços pagos aos produtores e pelos altos custos de produção.

Preto no Branco: O senhor tem uma das trajetórias mais destacadas na agroindústria do Paraná e do Brasil e, recentemente, assumiu a presidência do Sindicato de Leite do Paraná. O segmento enfrenta uma intensa crise, com produtores sob imensa pressão. O Paraná é o segundo maior produtor de leite do país e o Oeste é a segunda maior bacia do estado. Como enfrentar esse imenso problema?
Elias Zydek: O cenário que encontramos hoje é de grande complexidade, e no setor leiteiro, ele é especialmente desafiador. A crise que assola o setor está diretamente ligada à dinâmica global de oferta e demanda. O que aconteceu, especificamente no leite, foi um desequilíbrio perigoso. Primeiro, houve um aumento da produção nacional. Segundo, e de forma agravante, houve um aumento da importação para o país. O resultado direto e imediato dessa equação é que "sobrou leite" no mercado. Quando a produção, em qualquer cadeia produtiva, supera a demanda de forma significativa, isso invariavelmente derruba o preço.

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Preto no Branco: E em quem acaba refletindo isso de forma mais perigosa?
Elias Zydek: Essa queda de preço atinge duramente toda a cadeia, mas é o produtor rural que sente o impacto mais cruelmente. Se a rentabilidade é baixa e a atividade se torna inviável, o que observamos é o produtor parando de produzir ou mudando de setor. É um ciclo perverso: daqui a pouco, se o preço não se sustentar, teremos o problema inverso: falta de leite no futuro. Portanto, a atenção à demanda precisa ser constante e muito bem monitorada.

Preto no Branco: O senhor mencionou a importação como um dos fatores. Como está o processo para pedir, ao governo, limitação da importação, sobretudo para reconstituição de leite em pó?
Elias Zydek: Essa questão dos produtos importados reconstituídos a partir do leite em pó, que gerou tanta pressão sobre os preços, precisa ser analisada com precisão. O Paraná, de fato, agiu para proibir esse processo, mas essa medida estadual ajuda, mas não resolve o problema central da crise. E ela ajuda apenas uma parcela muito pequena da cadeia.
É importante esclarecer que, por lei nacional, já está proibido transformar leite em pó importado em leite reconstruído para ser vendido como bebida láctea líquida. 

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Preto no Branco: E quem tem absorvido essa cadeia de importação?
Elias Zydek: quando analisamos quem está importando o leite em pó, vemos que não é predominantemente a cadeia de laticínios. Na verdade, o leite em pó está sendo absorvido pela indústria de biscoito, de doce e de chocolate no Brasil. Portanto, o alcance dessa medida, focada apenas na bebida láctea, não deve ser muito grande para aliviar a crise. O desafio real é de ordem estratégica e de competitividade internacional. Como o Brasil é competente em produzir, o problema está na demanda e na necessidade de tirar do país o excedente da produção a partir da exportação. E o que inviabiliza as cadeias, como a do leite, é justamente ter mais produção do que o mercado interno pode absorver, derrubando os preços.

Preto no Branco: O produtor paranaense, e aqui no Oeste, precisa competir com preços internacionais. Qual seria a medida pensada pelo Sindileite para essa gestão? 
Elias Zydek: É exatamente essa a nossa proposta na presidência do Sindileite. Estamos propondo uma grande discussão estratégica do leite no Paraná. Estamos chamando isso de o primeiro grande projeto estratégico da cadeia do leite do estado do Paraná. Trata-se de uma verdadeira reinvenção do segmento. O grande desafio, o parâmetro que o produtor tem que alcançar, é a produção a um custo de 35 a 40 centavos de dólar o litro. Esse é o preço que nossos competidores globais, como Nova Zelândia, Uruguai e Argentina, conseguem produzir e, consequentemente, colocar o produto aqui dentro. Se não atingirmos essa competitividade, estaremos sempre em desvantagem.

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Preto no Branco: E como chegar lá]?
Elias Zydek: Para chegar lá, precisamos de uma transformação profunda, que passa por diversas frentes, e não apenas pelo produtor. Precisamos da desoneração da cadeia; revisão tributária, pois a carga tributária sobre o leite e seus derivados é muito grande e precisa ser retirada ou reduzida significativamente.

Preto no Branco: E além desses pontos]?
Elias Zydek: Temos que olhar para os modelos de produção.  Precisamos criar e implementar novos modelos de produção nas propriedades, que são de tamanhos variados (pequenas, médias e grandes), além disso a logística e assistência técnica precisam ser melhoradas, a logística de forma geral, para que possa garantir uma assistência técnica dirigida e eficiente.

Preto no Branco: Muito se fala da necessidade de uma revolução no setor. É isso mesmo? 
Elias Zydek: Sim, e ela envolve a participação de todos os órgãos de governo, a Secretaria da Agricultura, a Faep, a Fetaep e todas as entidades relacionadas. É um projeto de transformação que buscamos concluir até o fim deste ano, com um foco claro na viabilidade econômica da propriedade. Tem que dar resultado, lucro.

Preto no Branco: Como a volatilidade do câmbio e a dependência do dólar impactam numa estratégia de exportações?
Elias Zydek: A dependência da exportação é total. O Brasil é um produtor competente de grãos, suínos, frango, leite e boi. Mas todas essas cadeias dependem de tirar do país o excedente da produção para vender lá fora. A suinocultura, por exemplo, precisa vender 25% da produção; a cadeia do frango, 36%; e a do boi, no mínimo, 15%. Se não fizermos isso, o excesso derruba o preço e inviabiliza o setor. O câmbio é um fator de risco enorme. Se o país é exportador, e o câmbio for baixo – ou seja, o real estiver valorizado, e o dólar cair, isso inviabiliza as exportações. Trazemos menos dólar para dentro e, consequentemente, menos conversão em reais.

Preto no Branco: Isso impacte fortemente sobre a suinocultura, não é?
Elias Zydek: Vejamos o desafio na suinocultura. Hoje, o custo de produção de um quilo do suíno vivo é de um dólar. Se o dólar está em R$ 5,40, o produtor recebe isso. Se o dólar cai para R$ 4,50, o setor precisa ser capaz de reduzir o custo de produção para R$ 4,50. A pergunta que fica é: temos competência, considerando toda a cadeia, impostos, logística, tributos e legislação, para baixar o custo na mesma proporção que o câmbio baixou?

Preto no Branco: Além disso, a cadeia externa também está exposta a variáveis
Elias Zydek: Essa é a grande questão, pois a demanda externa está sujeita a variáveis incontroláveis como câmbio, conflitos e relações internacionais.

Preto no Branco: O poder de compra do brasileiro no mercado interno é suficiente para absorver a produção? 
Elias Zydek: A capacidade do brasileiro de comprar alimentos, o poder aquisitivo da população, é o segundo grande ponto de atenção, ao lado da exportação. O que está acontecendo no Brasil é um processo onde cada vez mais gente está dependendo do governo para sobreviver. Poderíamos ter um consumo interno muito maior se tivéssemos a capacidade de aumentar a renda da população. Isso ativaria toda a economia da produção e permitiria até preços menores, pois mais gente estaria consumindo. O que o Brasil está precisando, e isso impacta diretamente o leite e todas as cadeias produtivas, é gerar renda, valorizar o trabalho e aumentar a produtividade. Não é aumentar o assistencialismo, mas aumentar as oportunidades de trabalho para gerar renda para as pessoas. A economia interna precisa desse modelo.

Preto no Branco: Como podemos estimar o futuro do mercado do leite para o Paraná.?
Elias Zydek: Entendemos que o valor agregado se dá em três grandes ondas: primeiro, a produção até 1980; depois, a partir dos anos 2000, veio o processo de agroindústria, de transformação, de gerar valor e riqueza para o produtor rural. A Frimesa é fruto dessa intercooperação visando justamente agregar valor nas cadeias produtivas do suíno e do leite. Hoje, essa mesma filosofia de gestão e agregação de valor deve ser aplicada ao Sindileite. Temos uma estrutura industrial robusta, com três grandes plantas de laticínios – a maior em Marechal Cândido Rondon, que processa cerca de 800 milhões de litros por dia, Matelândia e a indústria de queijos em Santa Catarina. Essa capacidade exige que tenhamos uma matéria-prima constante e viável.

Preto no Branco: E quem mais ganha com isso?
Elias Zydek: A visão do Sindileite é garantir que o setor seja viável, que o produtor tenha qualidade de vida, ganho e rentabilidade. Se a propriedade não for viável, a cadeia inteira acaba. É por isso que o Projeto Estratégico do Leite é tão vital: ele busca não apenas a competitividade de custo, mas a sustentabilidade do produtor, conciliando a necessidade de ser "verde no metal" ambientalmente e socialmente correto, dentro dos princípios ESG, que incluem governança, com a necessidade de ser azul no bolso (rentável). Acreditamos que a solução passa pela transformação e pela visão de longo prazo para garantir que o cooperado paranaense, especialmente aqui do Oeste, continue forte e competitivo.

 

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