
O interior do Paraná enfrentou um dos maiores abalos climáticos da temporada: um temporal com granizo — acompanhado de ventos que superaram os 100 km/h — atingiu vastas áreas agrícolas e agora provoca perdas estimadas em milhões de reais, com máquinas danificadas, lavouras destruídas e replantios obrigatórios que pressionam o calendário agrícola. O evento climático registrado no último fim de semana investiu contra meio milhão de hectares de produção potencial, mas seu impacto se revela ainda mais grave: milhares de hectares de soja e de milho recém-plantados terão de ser replantados ou terão sua produtividade comprometida, enquanto o trigo que ainda aguardava colheita sofreu com vendavais e excesso de chuva, que comprometeu a qualidade do grão.
O temporal que atingiu praticamente metade do estado do Paraná — e se concentrou especialmente nas regiões Oeste e Central — fez disparar o sinal de alerta entre produtores de soja. Conforme o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), o volume de chuva superou acumulados de 100 mm em 24 horas em muitos municípios.
Produtores, como Davi Meneguel, relatam que lavouras de soja, ainda em processo de desenvolvimento, foram literalmente dizimadas por pedras de granizo, acamamento das plantas e rompimento de estruturas de apoio. “Nossa área de produção é na região de Santa Helena. Perdemos tudo, cerca de 150 hectares de soja”. Conta o produtor.
“As lavouras já vinham atrasadas”, alerta o presidente da Aprosoja Paraná, Eduardo Cassiano.
“Muitos terão que arcar com replantio, o que vai comprometer tanto a produtividade quanto a lucratividade”, conta.
No Oeste do Paraná, onde o cultivo de soja representa uma fatia importante da economia rural, o impacto se espalha: a perda de janela para replantio, o frio que já retardava o ciclo da cultura e a necessidade de reorganizar logística e tratos culturais criam novo patamar de risco.
O estrago na soja não é o único dano e motivo de preocupação. O atraso no calendário de semeadura — provocado pela necessidade de replantar áreas de soja ou aguardar que as lavouras se recuperem — pode comprometer a janela ideal de plantio da safrinha de milho, ou seja, da segunda safra que vem logo após a colheita da oleaginosa. Esse efeito “em cascata” aumenta o risco de perdas também para o milho. A região concentra quase um terço da produção do cereal no estado. “O atraso na colheita da soja pode reduzir a janela ideal para o plantio do milho safrinha e isso causa preocupação”, alerta o agrônomo José de Alencar Vieira.
Se o milho for plantado tarde demais, fica mais vulnerável a geadas no fim de ciclo ou ao estresse térmico no verão seguinte. Como resultado, o que se anunciava como “recuperação” depois de um ano agrícola difícil pode agora ficar seriamente comprometido.
Não foram apenas as lavouras que sofreram: a produção de proteína animal — frangos, peixes, suínos — também foi atingida em cheio. Na região de Palotina, por exemplo, ventos fortes, chuva intensa e granizo provocaram queda de postes de energia e suspensão do fornecimento elétrico por mais de 48 horas. Isso afetou gravemente aviários e piscicultura, que dependem totalmente de ventilação, bombeamento e aeração elétrica. Houve registro de suínos retirados de dentro d’água, redes caídas, estruturas desabadas.
Em termos gerais, o levantamento preliminar do Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep) menciona danos em barracões agrícolas, silos, estruturas de produção animal e muita infraestrutura destruída.
No Oeste, os municípios mais atingidos pelos temporais foram Santa Helena, Cascavel, Nova Aurora, Palotina, Toledo, Entre Rios do Oeste, Marechal Cândido Rondon e localidades próximas.
Equipes da Defesa Civil e das secretarias de infraestrutura foram mobiliadas em quase todas essas cidades para desobstrução de vias, atendimento a famílias e restabelecimento da circulação nas regiões afetadas.
O governo estadual reportou que, em alguns municípios as perdas foram estimadas em milhões de sacas de milho e soja. Segundo o Departamento de Economia Rural (Deral) os dados ainda estão sendo contabilizados, mas são na casa dos milhões, podendo ultrapassar com facilidade meio bilhão de reais.
Produtores relatam perdas visíveis e angústia. Em municípios como Nova Aurora, uma produtora afirma que “não sobrou quase nada” de sua lavoura de soja. Em outra região da cidade, nas granjas, um produtor afirma que “os ventos arrancaram a cobertura da granja” e a mortalidade deve ficar próxima de 30 mil aves.
Essa dor se espalha entre milhares de famílias rurais, que agora enfrentam não apenas o custo adicional do replantio ou da manutenção das estruturas danificadas, mas um horizonte de incerteza. “Nossa grande dúvida é se o seguro vai cobrir alguma coisa e será que a safra dará lucro? Será que haverá tempo suficiente para plantar a soja agora e o milho depois?”, diz o sojicultor Odemar Stein, que teve a lavoura varrida pela enxurrada.
O Sistema Faep já manifestou solidariedade aos produtores rurais do Paraná e enfatizou a necessidade de atuação rápida dos governos estadual e federal — em especial na ampliação do seguro rural e linhas de crédito emergencial — para dar condições de reação aos produtores.
O governo do Estado informou que iniciou levantamentos dos danos em lavouras e estradas rurais, especialmente em regiões onde a chuva acumulada atingiu até 250 mm em dois dias, como o caso de municípios do Oeste. O governo também analisa medidas para auxiliar os produtores.
“Cada dia que passa sem poder replantar ou executar os tratos culturais reduz a janela para manter a competitividade da safra 2025/26”, enfatiza o agrônomo José de Alencar Vieira.
Para os produtores do Oeste do Paraná — vitais para a soja, o milho safrinha e a proteína animal — o chamado agora é para resposta rápida, assessoria técnica ativa, apoio financeiro emergencial e monitoramento rigoroso da janela de plantio. “Se o replantio for impossibilitado ou a janela para o milho for perdida, o impacto será sentido na colheita de 2026 e poderá gerar efeito cascata em toda cadeia produtiva”, alerta Vieira.
Mín. 14° Máx. 25°
